Violência de Gênero: Conhecer para Combater

Por: Valdilene Oliveira Martins

Foto: Divulgação

Direitos da Mulher

Sem dúvidas, a efetivação da equidade de gênero é uma das vias indispensáveis para a evolução de uma sociedade. Dentro deste contexto, faz-se mister a desconstrução de costumes e práticas que, há milênios, dão suporte a uma suposta supremacia masculina, resultando no desequilíbrio das relações de convivência social, afetiva e familiar entre homens e mulheres.

Para adentrarmos neste assunto, prescinde definirmos brevemente os conceitos de patriarcado, machismo, deminismo, sexismo e de misoginia:

Patriarcado – é uma formação social em que, simplesmente, o poder (lato sensu) é dos homens, ou seja, trata-se de uma dominação masculina.

Sexismo – é uma forma discriminatória que convenciona quais usos e costumes devem ser respeitados pelas pessoas, de acordo com o sexo delas. Essas convenções vão desde o modo de se vestir e de falar, até qual deve ser o comportamento social adequado.

Machismo – é a suposição de que o homem é superior à mulher. É uma ordem posta, vigente e estrutural, que viola os direitos da mulher, pois lesiona e mata dezenas delas, todos os dias.  Vale destacar que ele não é o contrário do feminismo.

Feminismo – é a concepção de que mulheres e homens são iguais em direitos e obrigações. O feminismo não objetiva uma inversão de soberania, o movimento é uma reação ao machismo e luta para que as mulheres tenham poder sobre elas mesmas.

Misoginia – é a repulsa, o desprezo ou o pavor ao feminino. Salienta-se que a misoginia nada tem a ver com orientação sexual, gostar ou não de fazer sexo com mulheres não define o misógino.

Misógino é uma característica daquele que desenvolve uma aversão mórbida ao feminino, a ponto dessa aversão se materializar numa ideologia de opressão, acompanhada de violência que pode se apresentar de várias maneiras: física, psicológica, moral, sexual, política, sociológica e cultural.

Apesar disso, as manifestações de misoginia não são simples de serem percebidas e o meu intuito aqui, hoje, é deixar um alerta. O machismo e a misoginia estão diretamente relacionados com a violência (em sentido amplo) que é praticada contra a mulher, em nossa sociedade.

Podemos citar o exemplo da insistente conduta, de alguns componentes da mídia,  em pura e simplesmente, limitar a imagem da mulher à futilidades, ao âmbito doméstico, ou ao patamar das necessidades sexuais e de consumo do homem.

A objetificação da mulher é um fato lamentável. É uma  depreciação do ser feminino que ocorre com tanta frequência e de forma tão banal, apesar de estamos em pleno século XXI, em virtude de que, ao mesmo tempo em que a objetificam, “endeusam” a sua imagem enquanto menina que “amadurece” mais cedo que o menino, mulher que “faz mil coisas de uma só vez”, a mãe e a esposa que “sempre devem perdoar e tolerar tudo”, contribuem para que a mulher permaneça em uma situação de submissão e subserviência.

Na sociedade brasileira, o sexismo com base no patriarcado ainda é muito presente em nosso dia a dia. As mulheres sofrem assédios desde cedo e essas situações passam a ser vistas com naturalidade, até por elas mesmas, já que esse assédio, muitas vezes, é iniciado no seio familiar, estendendo-se para as escolas, as ruas ou o trabalho. Enfim, em quase todos os ambientes por onde passam, as mulheres são vítimas constantes de assédios sexual, moral e psicológico, rotineiramente, travestidos de elogios. Sabe aquela mulher “tão linda” quem nem precisava ser inteligente? Ou aquela doutoura quem “nem tem cara de advogada criminalista”? Aquela mulher que chegou para “enfeitar” o ambiente? Ou ainda aquela tão inteligente que “nem parece que é negra”?

As condutas misógina e machista não param por ai:

“INCONFORMADO COM O FIM DO RELACIONAMENTO…”;

“AO DESCOBRIR QUE FOI TRAIDO…”

Essas são as frases que sempre iniciam as notícias dos homicídios, qualificados pelo feminicídio (assassinatos de mulheres, em razão do gênero, decorrente de relações familiares e afetivas). O que é pretendido quando se inicia a notícia de um crime com a justificativa para que ele aconteça?

“OS ENCONTROS AMOROSOS OCORRIAM NO QUARTO DA ENTEADA…”

A frase acima foi dita por um repórter, em determinado noticiário, ao narrar o caso de um padrasto, com 40 anos de idade, que, habitualmente, estuprava sua enteada de 12 anos de idade. O que é pretendido quando se romantiza uma violência tão covarde e hedionda contra uma pessoa completamente vulnerável? “encontros amorosos”?

“MULHER É ENCONTRADA BÊBADA, COM SINAIS DE ESTUPRO…”

O que é pretendido, novamente, quando se inicia a notícia de um crime colocando em xeque a conduta da vítima? Como se ficar bêbado fosse uma exclusividade masculina e como se o fato de que uma mulher esteja bêbada justificasse o cometimento de um crime contra ela.

Hoje, tomamos conhecimento do que ocorre no mundo, em tempo real, o volume de informação chega, por vezes, a nos confundir. Portanto, os profissionais da comunicação devem se preocupar, cada vez mais, com a qualidade dos seus serviços e em observar a função social do seu trabalho, já que os meios de comunicação servem para informar, entreter e educar. 

Não queremos ser donas da verdade, o nosso desejo é provocar uma reflexão coletiva, pois todas nós, seres humanos, somos peças fundamentais da evolução  social.

A legislação brasileira deixou de respaldar a sujeição e a inferioridade feminina apenas no século passado, pouquíssimo tempo em termos de história e de mudança cultural. A palavra SORORIDADE (que é a união e aliança entre mulheres, baseada na empatia e companheirismo, sendo definido como um aspecto de dimensões ética, política e prática da luta pela igualdade entre os gêneros) ainda não é conhecido por muitas mulheres, muito menos praticada, pois poucas delas têm a consciência de que NÃO SOMOS INIMIGAS!

O ENCORAJAMENTO feminino é erroneamente visto como uma vingança, como uma tentativa de “tomar o poder”, visto como o “lugar do homem”. O EMPODERAMENTO feminino, muitas vezes, é confundido com o simples fato de mulheres terem autonomia financeira.  Ocorre que, ao contrário do encorajamento, o empoderamento feminino não se dá individualmente, ele deve ser coletivo e só será efetivado se provocar uma mudança social. O empoderamento feminino constitui-se numa série de ações e atitudes que levam a uma valorização do ser mulher, possibilitando assim, uma nova consciência coletiva, necessária para a superação da dependência social feminina e da dominação masculina.

Vergonhosamente, a descoberta de que os direitos humanos também são direitos da mulher e de que elas têm direito à liberdade e a ocupar os espaços públicos, bem como as esferas de poder, tanto quanto os homens, é muito recente, especialmente quando se tratam de mulheres negras, que sempre estiveram e ainda estão na base da pirâmide social, as quais são as mais passíveis de sofrer todos os tipos de violência e as que têm menos acesso à saúde, à educação, à moradia, ao trabalho, entre outros.

Não é fácil combater a “ordem” social, não é fácil adquirir a percepção do que é, de onde está e de que forma se apresenta o machismo. Não é fácil buscar ocupar o lugar que é da mulher, por direito. Então, aquelas que já despertaram devem ter paciência, tentar entender e buscar ajudar as outras mulheres que ainda estão submersas nas lamas escuras do machismo.

Por fim, destacamos que a palavra de ordem é DESCONSTRUÇÃO, precisamos criar uma nova ordem, iniciando-a pela educação das nossas crianças, em que a equidade e o respeito às diferenças sejam princípios basilares. Devemos remover o sexismo dos nossos lares, das nossas escolas, da nossa sociedade… e, por fim, das nossas vidas, porque ele já nos causou danos demais.

A parceria entre mulheres e homens é imprescindível na construção de um mundo melhor para se viver. A luta pela equidade de gênero é uma luta da humanidade, que tem a mulher como protagonista. Mas, se o homem faz parte do problema, obrigatoriamente, ele deverá fazer parte da solução.


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